DIVÓRCIO LITIGIOSO – BREVES CONSIDERAÇÕES PROCESSUAIS E SISTÊMICAS-

Por Fernanda Zanicotti Leite e Aline Maria Lima Leoni. @direitodasfamilias.curitiba https://www.instagram.com/direitodasfamilias.curitiba/

O divórcio é um instituto relativamente recente no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista que admitido somente no ano de 1977, através da Emenda Constitucional n.º 09. Porém, daquela época para cá muitas mudanças ocorreram e o divórcio hoje em dia é muito diferente do que ocorria antigamente.

Hoje não é mais necessário aguardar qualquer prazo entre a separação de fato e de direito, sendo possível dar entrada no processo de divórcio imediatamente após a tomada da decisão. Também não há mais espaço para discussões acerca da culpa pelo término do relacionamento. Com isso, não são mais aplicados os efeitos punitivos que advinham desta análise.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a igualdade de gêneros foi elevada ao status de direito fundamental (artigo 5º, inciso I, CF). Com isso, assegurou-se a igualdade entre os cônjuges no que tange aos direitos e deveres dentro das instituições familiares e também no que tange aos direitos após o rompimento do vínculo familiar.

O objetivo do divórcio é colocar fim à sociedade conjugal. Isso pode acontecer de forma consensual ou litigiosa. Este artigo versa especificamente sobre o divórcio litigioso – quando o casal não consegue chegar a um acordo sobre os seguintes pontos: término do relacionamento, partilha de bens, guarda e pensão de filhos.

Mesmo que uma das partes não concorde com o término da relação o divórcio será decretado, pois ninguém é obrigado a permanecer casado contra a sua vontade. O juiz pode fazer isso já na primeira análise e continuar o processo com relação aos demais pontos controvertidos.

O divórcio litigioso obrigatoriamente deve ser realizado em Juízo, ou seja, mediante a propositura de uma ação judicial e somente os cônjuges podem fazer o pedido. As partes devem ser assistidas por advogado ou defensor público. Também há a possibilidade de as partes serem representadas por curador ou por pessoa munida de procuração, caso estejam por algum motivo incapacitadas de realizar o pedido, a depender do caso.

Na petição inicial o autor, que pode ser qualquer um dos cônjuges, deverá apresentar um breve resumo sobre os fatos relevantes que envolvem a relação do casal, como a data do casamento, a data do término, os bens a serem partilhados, se tiveram filhos e, caso os filhos sejam menores de idade, questões sobre a guarda, regime de visitação e pensão alimentícia. Há a possibilidade de se pleitear a pensão alimentícia em favor da própria parte, o que será analisado pelo juiz no caso concreto. Na petição inicial não é necessário expor detalhes do relacionamento. Como mencionado anteriormente, não se discute neste processo questões de culpa pelo término da relação. Os detalhes íntimos que levaram ao divórcio acabam sendo uma exposição desnecessária e, possivelmente, alimentem ainda mais as desavenças entre as partes.

É possível fazer o pedido de algumas medidas em caráter de tutela de urgência, como, por exemplo, alimentos e guarda provisória.

Após o juiz receber e analisar a petição inicial, poderá designar uma audiência de conciliação prévia, na qual as partes poderão conversar e tentar realizar um acordo.

É importante dizer que as partes podem realizar um acordo a qualquer momento do processo. Caso isso aconteça, deve ser informado ao juiz e juntado aos Autos. Se o processo envolver filhos menores ou incapazes, o termo de acordo será encaminhado ao Ministério Público, que irá elaborar um parecer favorável ou não à homologação. Sendo favorável, o próximo passo será a homologação pelo juiz. Se não, as partes devem adequar o acordo aos termos do Juízo.

Não havendo o acordo em Audiência de Conciliação, a outra parte deverá apresentar sua defesa por meio da Contestação. É neste momento que a parte chamada de “Requerida” poderá apresentar a sua versão dos fatos e se manifestar sobre o contido na petição inicial. É muito importante que o Requerido apresente sua defesa, pois, em regra, o que não for rebatido será presumido como verdadeiro.

Caso as partes tenham filhos menores ou incapazes haverá o encaminhamento do processo ao Ministério Público, que poderá indicar a produção de algumas provas, caso entenda necessário.

Após isso, havendo prova testemunhal a ser produzida, será marcada uma Audiência de Instrução, em que poderão ser ouvidas as testemunhas e as partes.

No processo de divórcio litigioso, é possível produzir as seguintes provas: documentos referentes ao patrimônio a ser partilhado e à condição socioeconômica das partes, realização de estudo psicológico e social no caso de discussão sobre a guarda dos filhos, prova testemunhal, entre outras.

Finalizada a fase de produção de provas, o Ministério Público emitirá um parecer sobre o caso e o processo será enviado ao juiz para sentença.

O andamento processual descrito acima é a regra, porém pode haver diferenças entre cada processo, a depender da complexidade, do número de provas necessárias para esclarecer determinadas questões etc. Não há como precisar o tempo mínimo ou máximo de duração do processo, já que cada caso tem suas peculiaridades.

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Sob a visão sistêmica, é preciso atentar às raízes do conflito. O divórcio litigioso envolve muito mais do que a desavença entre as partes sobre a partilha de bens, a guarda dos filhos ou o valor da pensão.

Ele envolve o término de uma relação amorosa, que teve início a partir de sonhos e expectativas. É muito comum que uma ou ambas as partes se sintam desapontadas e tenham dificuldade em aceitar que o outro se vá. Para manter o vínculo, inconscientemente mantém-se o processo, o conflito.

Segundo Bert Helliger, criador das Constelações Familiares, “(…) as separações acontecem sem culpa. São, via de regra, inevitáveis. Quem procura pelo culpado ou pela culpa, em si ou no parceiro, recusa-se a encarar o inevitável. Procede como se pudesse ter havido uma outra solução, se… E não é verdade. Separações são consequências de envolvimentos, e cada parceiro está enredado da sua própria maneira”[1].

É importante que as partes tomem consciência da sua responsabilidade sobre o conflito e percebam que aquela pessoa era a certa para aquele momento. Quando se reconhece o quanto um aprendeu com o outro e se honra a história que tiveram juntos, o “motivo” que culminou no processo de Divórcio perde a importância.

É muito importante também que se preservem os filhos, caso os tenham, dos motivos que levaram o casal ao divórcio. O término do relacionamento diz respeito somente aos pais, aos ADULTOS. Às crianças, basta dizer que o pai continuará sendo o pai e a mãe continuará sendo a mãe. O amor continuará igual. Os filhos são 50% pai e 50% mãe e é muito comum que se sintam culpados pelo término da relação dos pais.

A eles não deve ser imputada a responsabilidade de se posicionar sobre o conflito. Quando há respeito entre os pais e honra ao relacionamento que passou, os filhos sentem alívio e podem seguir amando os pais sem culpa.

Por fim, quando nos deparamos com um processo de divórcio litigioso em que as partes não conseguem de nenhuma forma chegar a um consenso, quando a briga parece ficar cada vez maior, é preciso que as partes relembrem do início da relação e de tudo o que um aprendeu com o outro, pois honrando o passado e o parceiro é possível se libertar para o futuro.


[1] HELLINGER, Bert. Ordens do Amor: um guia para o trabalho com Constelações Familiares. Tradução de Newton de Araújo Queiroz. São Paulo: Cultrix, 2007.

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